segunda-feira, 21 de junho de 2010

Poluição sonora – Legislação vigente e ineficaz

321 - Poluição sonora – Legislação vigente e ineficaz

ANA RAQUEL COLARES DOS SANTOS LINARD - Juíza de Direito

Um dos grandes incômodos da vida em sociedade nos dias atuais é, seguramente, a poluição sonora. Com este mal nos deparamos cotidianamente sob várias formas de ruído em volume excessivo que, além de prejudicial à saúde física e mental, ainda constitui infração administrativa, contravenção penal e ilícito civil, devidamente estabelecidos em diversos diplomas legais.

Regular a produção de ruídos em volume excessivo já era objeto de preocupação desde a Roma antiga.

De fato, O Imperador César (101 - 44, antes de Cristo) determinou «que nenhuma espécie de veículo de rodas poderia permanecer dentro dos limites da cidade (Roma), do amanhecer à hora do crepúsculo; os que tivessem entrado durante a noite deveriam ficar parados e vazios à espera da referida hora». (César - Senatus Consultum - O Automóvel, de Halley).[1]

Mais adiante na linha do tempo, há o registro da Rainha Elizabeth I da Inglaterra, que reinou de 1588 a 1603, e que “proibia aos maridos ingleses baterem em suas mulheres depois da 10 horas da noite, a fim de não perturbarem os vizinhos com gritos”.[2]

Em que pese o malefício social do ruído excessivo, não se pode olvidar o prejuízo para a saúde do corpo e da mente decorrente da exposição a níveis sonoros acima dos 50 (cinqüenta) decibéis, limite que é considerado como confortável ao ouvido humano pela OMS e que equivale ao ruído de uma rua sem tráfego.[3]

Ressai claro, ainda, as conseqüências danosas ao organismo decorrentes da exposição ao barulho em excesso e que vão muito além da apregoada surdez. Na verdade, são prejuízos para a saúde física e mental, tais como estresse, irritação, cansaço, perda de sono e memória que, via de conseqüência, acarretam problemas cardíacos, neurológicos e até mesmo gástricos.

Muito embora tais informações não sejam de amplo conhecimento do público em geral, o bom senso, por si, já aponta no sentido de que qualquer que seja o exagero ou excesso, este se mostra indubitavelmente maléfico, acarretando conseqüências danosas tanto para quem produz como para quem sofre os efeitos do barulho em demasia.

Como tal conduta tem se tornado lamentavelmente comum, notadamente entre a população mais jovem, verifica-se a preocupação do legislador em tratar da questão através de vários normativos legais, os quais, em que pese sua vigência, infelizmente, não ostentam a eficácia que a sociedade espera, dada a incompreensível complacência das autoridades competentes em adotar as providências necessárias para garantir a aplicação efetiva dos diplomas legais, por razões imagináveis, como adiante se verá.

Dentre os aludidos normativos legais, que prevêem sanções de natureza administrativa, civil e penal, constam o artigo 42 da Lei de Contravenções Penais – a meu sentir, o mais eficaz dentre os demais – além dos artigos 228 e 229 do CTB[4] e os artigos 1.277 e seguintes do Código Civil, sem prejuízo, ainda, do teor dos artigos 54 e 59 da Lei 9.605/98 – ressaltando que o primeiro, cuja redação mencionava especificamente a produção de sons e ruídos em desacordo com as prescrições legais, foi vetado pelo Presidente da República sob o argumento de impropriedade técnica já que não mencionava na sua tipificação o bem jurídico tutelado, no caso, a qualidade ambiental.[5]

Assim, restou o preceito constante do artigo 54 da aludida lei, de natureza genérica, para os fins de uma pretensa regulação de poluição sonora, não sendo tarefa difícil concluir pela sua ineficácia para os fins em questão.[6]

A Constituição Federal de 1988, ao regular a matéria, estabeleceu a competência comum dos entes federativos para o combate à poluição, sob qualquer de suas formas, razão pela qual se verificam, ainda, diplomas estaduais e municipais que tem por objeto a regulação, no âmbito administrativo, das medidas destinadas a combater a poluição sonora.

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Ana Raquel Colares dos Santos Linard é juíza de Direito Titular do Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Juazeiro do Norte (CE).

Dezembro, 2009.

[1] http://www.pitoresco.com.br/consultoria/variedades/05.htm

[2] Idem.

[3] http://www.bauru.unesp.br/curso_cipa/4_doencas_do_trabalho/4_ruido.htm

[4] Art. 228. Usar no veículo equipamento com som em volume ou freqüência que não sejam autorizados pelo CONTRAN: Infração - grave; Penalidade - multa;
Medida administrativa - retenção do veículo para regularização.
Art. 229. Usar indevidamente no veículo aparelho de alarme ou que produza sons e ruído que perturbem o sossego público, em desacordo com normas fixadas pelo CONTRAN:
Infração - média; Penalidade - multa e apreensão do veículo;
Medida administrativa - remoção do veículo.

[5] Art. 59. Produzir sons, ruídos ou vibrações em desacordo com as prescrições legais ou regulamentares, ou desrespeitando as normas sobre emissão ou imissão de ruídos e vibrações resultantes de quaisquer atividades.

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.



[6] Art. 54. causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:

Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Se o crime é culposo:

Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa.

Fonte:http://www.epm.tj.sp.gov.br/internas/ArtigosView.aspx?ID=6076

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